quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Onde os Fracos Não Têm Vez - Clássico contemporâneo dos irmãos Coen


Onde os Fracos Não Têm Vez (No Country For Old Men, 2007, EUA) é um filme destoante na carreira de Joel e Ethan Coen. Não pelo sentido depreciativo do termo, mas sim, por representar um tipo de cinema que os irmãos, em nenhum momento anterior, tinham apresentado ao público. No lugar das comédias de fino humor negro, repletas de situações oníricas ou absurdas, apareceu uma obra cerebral, que apresenta dura reflexão sobre a transformação, para pior, dos valores da sociedade americana.

O duelo entre o velho e o novo, mais precisamente as concepções morais de gerações diferentes, é o principal conflito existente no livro do experiente escritor americano Cormac McCarthy, que foi transposto em sua totalidade para as telas, através de adaptação dos próprios Coen. A história pode enganar caso se preste atenção apenas na sangrenta perseguição que conduz o filme: há muito mais por trás dos fatos mostrados.



Llewelyn Moss (Josh Brolin) é um soldador do oeste americano que encontra no deserto, em meio a uma chacina (resultado de uma negociação de drogas que não deu certo), uma maleta com 2 milhões de dólares. A partir deste momento, o assassino Anton Chigurh (Javier Bardem) é contratado para caçar Moss e recuperar o dinheiro. O xerife Ed Tom Bell (Tommy Lee Jones) acompanha os acontecimentos e, apesar de aparecer pouco em relação aos outros dois personagens, possui fundamental importância na narrativa.

Sobriedade é a palavra-chave do longa. A começar pela fotografia de Roger Deakins, que valoriza espaços amplos e tomadas abertas e gera uma forte sensação de isolamento em meio a mundo violento, e passa pela decisão de não usar qualquer tipo de trilha sonora.
Onde os Fracos Não Têm Vez é um dos raros filmes a descartar o uso de música. Porém, a forma que os Coen escolheram para contar a história dispensa técnicas supérfluas. Tudo é reduzido ao mínimo, inclusive os diálogos, e o efeito é excelente.


Joel e Ethan sempre foram críticos da sociedade. Toda a filmografia dos irmãos sabe apontar e ridicularizar as idiossincrasias humanas. Por mais exagerado, e este era o objetivo principal, havia sempre um alívio cômico para rirmos dos comportamentos esdrúxulos de seus personagens. Neste filme, não existe nada disso. Pelo contrário. Assassinatos absurdos, falta de ética, sensação de impotência e pessimismo tomam conta da atmosfera pesada da obra. A violência domina os atos de todos os indivíduos e não existe um alento que possa mostrar um novo caminho
(detalhe importante: o longa é ambientado em 1980 e, ainda assim, parece que vemos uma radiografia do mundo atual).

A "filosofia" do filme encontra ressonância direta nos protagonistas. Anton Chigurh, por mais maniqueísta que possa parecer seu personagem, possui uma moral complexa e segue uma linha de conduta imposta a si mesmo: seu trabalho de assassino de aluguel é a única coisa importante; tudo que se torna obstáculo para a realização de uma tarefa deve ser eliminado. Pela dificuldade para não cair no caricato, o espanhol Javier Bardem merece todos os méritos pela grande caracterização, vencedora de um merecido Oscar de coadjuvante. Seu Chigurh parece algo inumano, uma máquina assustadora, sem emoções, metódica. É o "mal absoluto", personificado em alguém com um corte de cabelo ridículo, voz gutural e que mata pessoas com uma arma para abater gados. Não é a toa o desconforto no espectador quando este homem aparece na tela.
Do lado oposto, Llewelyn Moss representa um "homem comum", no meio de eventos que não consegue reverter.


Contudo, é Ed Tom Bell o principal elemento de ligação entre o tom pessimista da narrativa e as imagens cruas e realistas. O filme abre com um monólogo do personagem, que relembra uma época na qual xerifes nem precisavam usar armas.
A vida perde sentido e valor cada vez mais rápido: "você não pode parar o que está vindo", diz um policial aposentado, fazendo alusão à própria violência, mas também, à decadência do entendimento entre os homens. Esta espécie de lamento dos novos "valores" (o título original em inglês, Onde os velhos não têm vez, faz muito mais sentido) fica claro na última cena, onde Ed Tom narra um sonho com seu falecido pai, também xerife.

Os Coen acertaram em tudo aqui. Desde criar um "anti-clímax", ao não mostrar o desfecho de Llewelyn Moss, até o simbólico final. Onde os Fracos Não Têm Vez ganhou o Oscar de melhor filme em 2008. Mesmo se não ganhasse nenhum prêmio, nada tiraria seu status de clássico contemporâneo e uma posição na lista das obras mais importantes da década.


"And in the dream I knew that he was goin' on ahead and he was fixin' to make a fire somewhere out there in all that dark and all that cold, and I knew that whenever I got there he would be there. And then I woke up."
Ed Tom Bell

Cotação: 5/5

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Thiago Borges

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Angry Alien - Paródias do cinema feita por coelhos

Ahhh, a internet...

Navegar na web é uma das melhores coisas do mundo. Permite a qualquer pessoa enriquecer sua cultura, conhecer outros países, entrar em contato com as mais variadas formas de arte...

e também achar maravilhas da humanidade como o site do Angry Alien Productions!!!!


Eu sei que ao ler o título do post, todos vão pensar em algo bizarro, como lindos e fofos coelhos de verdade vestidos como Darth Vader ou Indiana Jones. Nada disso. O nível de sandice do Homem não chegou a tanto.........
Tudo bem, existem coisas como esta, mas eu ainda acredito na sociedade...

Enfim, o Angry Alien funciona da seguinte maneira: são animações em Flash protagonizadas por coelhos, provavelmente usuários de drogas pesadas e ilícitas, que parodiam filmes marcantes da história do cinema em apenas 30 segundos. Isso mesmo. Meio minuto para alguns comedores de cenoura saltitantes contarem a história de clássicos como Casablanca, Guerra nas Estrelas, O Iluminado, Tubarão, Os Caçadores da Arca Perdida e Pulp Fiction; passando ainda por mais recentes como Clube da Luta, Jogos Mortais, Homem-Aranha e até o sucesso adolescente Crepúsculo.

O resultado é sensacional!!! Graças ao curto tempo, vários fatores contribuem muito para o estilo cômico das reencenações: as cenas clássicas de cada longa que se intercalam de forma bem rápida, os diálogos velozes, com direito a trilha sonora, feita pelos próprios dubladores, e até imitação dos atores de carne e osso, o que deixa todas as vozes hilárias (o sotaque do coelho que "interpreta" James Stewart, em A Felicidade Não Se Compra, é impagável).

É claro que para não ficar com uma cara de what the fuck is that? o ideal é conhecer os filmes antes de assistir sua respectiva animação. Assim, as imagens aparentemente sem ligação fazem sentido e fica muito mais engraçado perceber como tudo não passa de uma homenagem bem sacada à Sétima Arte.

Não sei muito dos organizadores do site, apenas que a cartunista americana Jennifer Shiman, que também faz as vozes, é a criadora da ideia. Aliás, a animadora já ganhou alguns prêmios importantes com o projeto, como Melhor Série de Internet, no Ottawa International Animation Festival, e Melhor Curta Metragem, no Fantasia Film Festival de Montreal.

Apenas um aviso: o site é em inglês e os nomes dos filmes aparecerão na língua da terra do Tio Sam.

"I'm the king of the world": Leonardo Di Caprio na versão bunny em Titanic


Indiana Jones em busca da Arca da Aliança


Uma nova "roupagem" para Pulp Fiction

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

Três Homens em Conflito - O maior western de todos os tempos?


"Quando for atirar, atire, não fale". Esta pérola do humor negro, proferida pelo personagem de Eli Wallach, define o lema do velho oeste americano. Aquele que não brinca em serviço tem mais chances de sobreviver nesta terra de ninguém. "Três Homens em Conflito" (Il buono, Il brutto, Il cattivo, 1966, Itália/Espanha/EUA) pega o mito do colonizador e o joga em um verdadeiro espetáculo sonoro e imagético de ação, violência, drama e comédia – é um clássico muito grande para ser definido como mero faroeste e entraria fácil na lista dos filmes "maiores que a vida", como bem define o crítico americano Roger Ebert. Aliás, aqui só não entra romance. Afinal, Clint Eastwood, Lee Van Cleef e o próprio Wallach são duros e rudes demais para se apaixonar...

O diretor Sergio Leone foi o maior ícone de um subgênero do western denominado spaghetti, cujo auge ocorreu nos anos 60 e 70. O nome tem explicação: normalmente, eram italianos que os rodavam, com o mínimo de orçamento, usando atores americanos iniciantes ou decadentes. As histórias, que apresentavam "mocinhos" solitários e mal encarados em busca de tesouros ou quantias perdidas em dólares, aliadas à violência estilizada, fizeram sucesso na Europa e, de forma tardia, nos EUA. Coube a Leone elevar os spaghetti, que eram mal vistos pelos puristas adoradores de faroestes, a um patamar artístico inigualável dentro do gênero.

"Três Homens em Conflito"
é o elo final da chamada "trilogia dos dólares", composta ainda por "Por um Punhado de Dólares" (1964) e "Por Uns Dólares a Mais" (1965), todos protagonizados por Clint Eastwood – vale lembrar que somente após estes filmes, interpretando o Homem Sem Nome, Clint se tornou um astro de Hollywood. Sergio Leone ainda faria outros westerns essenciais, como "Era Uma Vez no Oeste", que também é lembrado como um dos melhores do gênero, e "Quando Explode a Vingança", antes de falecer, aos 60 anos, em 1989.


Os créditos iniciais de "Três Homens em Conflito" seguem o mesmo esquema que se tornou marca registrada dos spaghetti: uma agitada animação com cavalos, canhões, rostos dos atores principais e nomes da equipe de produção. Porém, é o estilo lento e operístico de Leone que dita o ritmo das quase três horas de produção. Somos apresentados, sem pressa, aos três homens do título original em italiano. O Bom é o Homem Sem Nome, apelidado de Blondie, vivido por Clint Eastwood. Sisudo, de poucas palavras, possui uma mira perfeita e prefere andar sozinho pelos diferentes condados do Texas. O Mau é Sentenza, conhecido como Angel Eyes, interpretado por Lee Van Cleef, mercenário sem sentimentos que faz tudo a seu alcance para finalizar um trabalho iniciado. O Feio é Tuco Ramirez, papel de Eli Wallach, trambiqueiro procurado em mais de 12 cidades.

É interessante ver como estas alcunhas não correspondem totalmente à realidade. Leone brinca com o título do filme. Em seu velho oeste, não existe mais o maniqueísmo de herói e vilão. O caráter se molda com o desenrolar dos fatos. Blondie e Tuco aplicam golpes em uma parceria um tanto tumultuada: o primeiro entrega o segundo às autoridades e na hora em que este vai ser enforcado, atira na corda, ficando com a recompensa que é dividida entre os dois. Brigas mais tarde, Blondie abandona Tuco no deserto, que depois faz o mesmo com o companheiro. O estereótipo de cada personagem, que o espectador espera ser seguido por todo o filme, é desconstruído conforme o dinheiro entra em jogo. Angel Eyes é o que mais faz jus ao apelido, com seu serviço de assassino por encomenda. Finalmente, os destinos dos três homens se unem no momento da descoberta de 200 mil dólares enterrados em um cemitério. Cada um inicia sua busca pelo tesouro em plena Guerra Civil Americana, passando no centro do fogo cruzado entre Confederados e exército da União.

Os encontros e desencontros dos protagonistas são conduzidos de forma reflexiva, mas nunca lenta ou arrastada demais. Somos presenteados com longas tomadas panorâmicas e extensos closes, o que gera um perfeito contraponto entre o coletivo e o íntimo. Ao mesmo tempo em que a paisagem mítica do oeste é mostrada de forma encantadora, vemos os poros, as cicatrizes, a barba malfeita dos rostos duros queimados pelo sol, quando a câmera se aproxima dos atores. Outra marca de Sergio Leone são as diversas sequências em que temos ausência de diálogos. Imagens falam mais do que palavras, por isso o uso de frases curtas, mas impactantes, como as tiradas de humor, que são sempre as mais lembradas – um belo exemplo é a que abre este texto. "Três Homens" é um dos poucos filmes em que a imagem, o som e até o silêncio se casam de forma irretocável.


Trilha sonora, aliás, que merece destaque especial. A parceria entre Leone e o maestro/compositor italiano Ennio Morricone, um dos mais respeitados da história do cinema, chega ao ápice. A música de abertura, que emula sons de coiotes, aparece em todo o longa, com variações geniais de ritmo e instrumentos – não tem como negar o caráter cômico quando ela é apresentada de forma mais lenta. Porém, a grande peça do filme é "Ecstasy of Gold". Em apenas uma cena, o tema entra para angariar um respeitável posto na lista de momentos inesquecíveis da Sétima Arte. Quando Tuco encontra o cemitério no qual o dinheiro está escondido, a câmera e a música acompanham o crescente estado de euforia do personagem. Após tanto esforço, a chegada ao local ganha contornos épicos, graças à grandiosidade do trabalho de Morricone. Emocionante é pouco para definir a sequência.

Assim como tensão é a palavra errada para resumir o truelo final entre o Bom, o Mau e o Feio. Leone não é mestre apenas em mostrar a violência pura e simples: a "pré-violência", o que ocorre antes do revólver disparar, também é essencial. E o jogo de imagens antes de definir com quem ficará a fortuna mostra isso. Closes frenéticos nos olhos, rostos, coldres e mãos fazem o espectador grudar na poltrona. O tempo é alongado ao máximo e faz o suspense se tornar palpável - quase dá para sentir o suor frio dos personagens.

Em suma, "Três Homens em Conflito" é obrigatório para qualquer pessoa que tenha o mínimo interesse em cinema. É a prova de que diferentes gêneros podem coexistir em um mesmo filme, com um resultado final brilhante. Espetáculo completo, que transforma o western, gênero muitas vezes encarado como algo menor, em arte pura.

quarta-feira, 29 de julho de 2009

Daunbailó - Filmaço de Jim Jarmusch


Daunbailó (Down By Law, 1986, EUA/Alemanha) é um filme que conquista o espectador de forma arrebatadora. Espera-se algo bom, até pelo status cult adquirido pelo longa desde o seu lançamento. Mas o que o diretor Jim Jarmusch nos oferece é muito maior. De situações rotineiras, em que o tédio e a desilusão parecem consumir a todos, é retirada uma espécie de humor sutil, de bom gosto, a partir de personagens cativantes, verdadeiros anti-heróis de uma jornada quixotesca.

Revelar detalhes maiores da trama com certeza tiraria a graça de ser surpreendido a cada rumo tomado pelos protagonistas. Basta saber que temos três desajeitados cujas trajetórias se encontram na cadeia. Zack (o músico Tom Waits) acaba atrás das grades graças a um mal entendido. Jack (John Lurie) cai em uma armação da polícia e também é preso sem ter feito nada. Lá, ganham a companhia de um italiano chamado Roberto (Roberto Begnini), que se torna o elo entre os dois americanos birrentos e de saco cheio um do outro. Personalidades distintas que criam, na marra, uma amizade improvável.

A grande pérola da história é, sem dúvida, os três prisioneiros. Homens a margem da sociedade, que perambulam por aí sem fazer nada (ou fazendo o mínimo para sobreviver) se transformam em personagens muito bem construídos, cada um com sua característica própria. Zack e Jack, sempre brigando entre si e entediados com a vida, representam o contraponto do falante Roberto, que fala inglês aos trancos e usa um caderninho para lembrar algumas frases mais difíceis. Em outro ator, o papel provavelmente não ficaria tão rico. Para Roberto Begnini, cai como uma luva. Ele pega os clichês clássicos dos "carcamanos" (fala rápida e alta, gestos largos) e cria um homem ingênuo, mas sempre confiante, que acredita na amizade dos companheiros de cela como uma forma de encarar as dificuldades da vida. Aqui, o ator está melhor que na premiada interpretação de A Vida É Bela.


O roteiro escrito pelo próprio Jim Jarmusch costura muito bem as contradições dos trambiqueiros. A convivência entre eles, que vai desde tentativa de fuga até passeio de barco em um rio, sempre é pontuada por momentos de humor genuíno, nascido de situações naturais. As próprias atitudes dos personagens tornam tudo mais hilário e absurdo; não há aquela forçada de barra para uma cena se tornar engraçada, como em inúmeros filmes de "comédia" atuais, que pecam por esquecer a inteligência em casa. A certeza da qualidade cômica de Daunbailó pode ser conferida em várias cenas envolvendo Roberto (lembrem-se da frase I scream, you scream, we all scream for ice cream e vão saber do que falo...).

É claro que não se faz um filme apenas com uma boa história. A narrativa deve ter algo de diferente para criar o clima necessário. Jarmusch não apenas subverte o sentido de comédia, como aponta um caminho muito interessante. Ao invés de tudo ocorrer rápido, de verborragia burra, igual a todo filme de humor, ele prefere, em muitos momentos, deixar a câmera parada, como se a mesma fizesse parte do ambiente, com o único intuito de capturar as grandes atuações que ocorrem na frente dela. Parece até que tudo foi improvisado na hora da filmagem, tamanha a espontaneidade que o efeito gera. Combinado com o preto e branco de Robbie Müller, o mesmo da belíssima fotografia de Paris, Texas, do diretor alemão Wim Wenders, algumas imagens doem na alma de tão lindas. Os contrastes entre luz e sombra criam o tom de fábula e sonho da inusitada aventura.

Além dos aspectos técnicos, a trilha sonora também se destaca. Feita pelo próprio Tom Waits, abusa da variedade, como free jazz, blues, rock e até ritmos latinos, alternando entre o calmo e o nervoso. Os dois pontos altos são o tema de abertura, Jockey Full of Bourbon, uma espécie de mambo, e Tango 'Till They're Sore, que fecha os créditos finais, com muita ironia, de forma perfeita.


Com uma história deliciosa e personagens apaixonantes, Daunbailó é uma das melhores coisas que o cinema independente americano já fez. O nome em português (que ao imitar a pronuncia em inglês parece ser bobo, mas é muito original) confirma ainda mais o espírito leve e irreverente do longa. Se repararmos bem, a mensagem do filme é mostrar a união como única forma de superar as adversidades, independente a quem nos unimos. O sr. Jarmusch achou uma excelente forma de passa lição de moral com originalidade.

quarta-feira, 22 de julho de 2009

Churros na Madrugada

Hoje, teremos uma matéria que fiz em junho para um trabalho da faculdade. Apesar de ser um texto grande, vale a pena lê-lo, pois mostra algumas curiosidades sobre um local bastante singular desta excelente cidade que é São Paulo. Bom divertimento!


Famosa casa que vendia o prato espanhol era símbolo nostálgico da Mooca

"Seu" Antonio está doente. O dono do Churros da Mooca, um dos poucos lugares que ainda guardavam o lado romântico paulistano, teve que fechar o estabelecimento em agosto de 2008, devido a uma pneumonia grave. As histórias da churraria de 50 anos, contudo, ainda permanecem como um marco da Mooca e de uma época que não volta mais.

O pequeno e apertado espaço (a ponto de ficar lotado com menos de quinze pessoas no local) se localiza na Rua Ana Néri, número 282, próximo ao Centro. Antonio Garcia Lopes, 78 anos, herdou o local que pertencia à família do sogro, descendente de espanhol que já vendia iguarias de seu país. Brasileiro nato, "seu" Antonio, ou Toninho, como é carinhosamente chamado pelos amigos da região, continuou o comércio de doces e pães.

O estabelecimento, conhecido pelo apelido "Churros da Mooca", vide que nunca teve um nome oficial, abria suas portas bem cedo para vender café da manha aos trabalhadores do Centro Técnico Operacional do Banco Itaú. Pastéis, coxinhas e rosquinhas podiam ser consumidas até por volta de 11 horas da manhã, além, é claro, do churros em formato de roda.

Em 1984, ocorreu uma grande mudança na vida de "seu" Antonio: sua esposa, a pessoa que mais o ajudava na preparação dos quitutes, faleceu. Ele ainda conseguiu manter sozinho, por algum tempo, a oferta de diferentes alimentos. Porém, ao perceber o enorme sucesso que o churro fazia, fez mudanças significativas, que ajudaram a criar um aspecto místico em torno do local. Ao trabalhar apenas em finais de semana, estender o horário de funcionamento pelas madrugadas e se dedicar exclusivamente à venda do principal produto da casa, o Churros da Mooca conseguiu atrair ainda mais público e se fixar como ponto de visita do bairro italiano.

Apesar do aspecto simples que possuía (apenas um balcão, um tacho de óleo para fritar e os equipamentos para fazer a massa ilustravam o ambiente), a churraria tinha variados tipos de freqüentadores. Pessoas saídas de luxuosos bailes da terceira idade, noivos que acabavam de casar, jovens que voltavam para casa após festas e baladas. "Isso dava um ar luxuoso e aconchegante ao ambiente, o que chamava a atenção dos fregueses", afirma Débora Sato, 42 anos, nora de "seu" Antonio.

Com a popularidade que marcou os últimos anos da casa, os dias mais movimentados apresentavam filas de até 1 hora e meia. "Era difícil chegar e não ter ninguém na espera", diz Débora. No Dia das Mães, por exemplo, o churro se tornava presente disputado. "Era loucura. E ainda, domingo sempre foi o dia de maior venda", confirma.

O aspecto familiar do estabelecimento é um dos fatores importantes para entender o porquê do sucesso. Pessoas que eram jovens quando "seu" Antonio começou o negócio traziam, anos mais tarde, seus filhos e netos. Famílias se deslocavam de outros bairros para apreciar o prato. O local se tornou uma espécie de "ponto de encontro de gerações". "A Mooca contribui para este sentimento de comunidade, que é muito forte aqui", opina Débora.

Pelo horário de funcionamento, baderneiros e bêbados também eram encontrados, mas em menor escala. O relato de acontecimentos graves é raro, até pelo comportamento sereno do dono. "O Toninho era calmo e controlado", relembra João Bezerra, 53 anos, dono de um bar próximo ao local. Só perdia a paciência quando alguém pedia recheio no churro. "Você quer pão doce? Isso não é churro!", falava, calmamente, "seu" Antonio ao freguês. A casa oferecia, no máximo, açúcar e canela.

O quitute vendido em carros por diversas ruas da cidade, com chocolate, doce de leite e granulado, não pode ser considerado o prato típico da Espanha. "Éramos o único lugar de São Paulo que vendia o verdadeiro churro espanhol", afirma Débora. Alguns estabelecimentos em shoppings centers declaram comercializar este produto, mas nenhum segue a receita que é guardada a sete chaves pela família. Há até um senhor no Tatuapé que se passa pelo "seu" Antonio, mas é claro que a cópia não tem a tradição e o sabor do original.

Como nunca teve qualquer tipo de publicidade própria, o Churros da Mooca mostra a importância do "boca a boca". Escondido atrás de uma banca de jornal, em uma rua com apenas razoável movimento de carros, tornou-se ponto importante das noites paulistanas graças aos próprios clientes. "Alguém levava o amigo, que depois indicava para mais pessoas, e assim por diante...", declara Débora, ao lembrar que nem mesmo placa com nome o local possuía.



Atualmente, o local é um despachante

Além de conquistar a confiança do público durante 50 anos, o número de histórias e anedotas é proporcional à sua fama. Dizem que o cubículo em que Toninho vendia seus alimentos foi pago com um burro. Outra lenda, fala que garotos roubavam garrafas de leite, que eram deixadas nas portas das casas da Avenida Paes de Barros, para tomar de manhã junto com o churro.

Para explicar todas estas curiosidades, a casa foi tema de inúmeras reportagens em veículos impressos e TV, ao longo dos anos. O chef de cozinha francês Olivier Anquier fez questão de assumir a receita como o melhor churro que já comeu. "Sempre teve bastante gente atrás do Toninho. E mesmo depois que o lugar fechou, algumas pessoas ainda vêm procurá-lo", diz Ivanildo Lopes, 57 anos, morador do local há mais de uma década. Hoje, por ter a saúde mais fraca do que em outros tempos e não se encontrar mais em São Paulo, "seu" Antonio evita dar entrevistas.

Após a doença, seus filhos decidiram afastá-lo do trabalho. E, infelizmente, não há previsão de que a casa volte a funcionar. No lugar, agora é encontrado um despachante. Quanto a Toninho, mora em São Bernardo do Campo e exercita seu hobby favorito. "Ele sempre gostou de pescar. Agora está perto de um rio e pode aproveitar", afirma Sakari Takeda, 88 anos, amigo de longa data.

O Churros da Mooca representava uma espécie de "mundo à parte", cheio de curiosidades e excentricidades. Fará falta ao imaginário afetivo da Mooca e da cidade um local onde valores de comunidade e família eram cultivados.

quarta-feira, 15 de julho de 2009

Batman - O Messias: um clássico das HQ's

Muita gente (muita mesmo) acha que HQ's são coisas de crianças nerds com óculos fundo de garrafa, sardas no rosto e aparelhos ortodônticos que dão a volta na cabeça...

Também. Mas histórias em quadrinhos já deixaram de ser entretenimento infantil há muito tempo... Que o diga obras pesadas e sombrias como O Cavaleiro das Trevas, Demolidor - O Homem Sem Medo, Watchmen ou Sandman.

Se alguém ainda duvida disto, sugiro que leia Batman - O Messias. Com roteiro de Jim Starlin e arte de Bernie Wrightson, esta é uma das graphic novels mais perturbadoras do Cruzado de Capa, seja pela temática verossímil ou pela violência extrema contida na história.



Façamos um exercício de raciocínio. O Homem Morcego já enfrentou inúmeros vilões, dos mais variados tipos, desde palhaços loucos até deformados com dupla personalidade. Porém, em nenhum - NENHUM - momento dos 70 anos de sua existência ele foi tão subjugado, física e psicologicamente, quanto nesta obra. E o mais incrível: por um homem comum, com extrema inteligência e persuasão, mas ainda assim comum. Batman é preso, torturado, drogado, sofre lavagem cerebral. Tudo conduzido pelo Diácono Joseph Blackfire, que se auto proclama a encarnação de um antigo messias.

Com um discurso social, o diácono organiza uma espécie de seita para "limpar" a cidade de criminosos. Assim, assassinatos de ladrões, cafetões e outros tipos do submundo começam a ocorrer em grande escala. Batman então é capturado, manipulado e as ações de Blackfire saem fora do controle dos governantes de Gotham City.

É interessante ver como Batman pode ser extremamente vulnerável. As alucinações causadas pelas drogas que lhe são medicadas fazem o morcegão ter sonhos e visões que destroem seus princípios e crenças. Ele se vê matando inimigos a machadadas, chorando como criança perante seus medos e chega ao limite no momento em que recusa a promessa de proteger a cidade, quando esta cai nas mãos do homem que o domina.



Isso só reforça o que ele realmente é: um homem. Nada mais. Não possui poderes, não voa, tampouco ergue carros com uma mão. Duvida de si mesmo, pensa em desistir, e, ainda assim, segue com o que necessita fazer. Não por soberba ou arrogância, mas sim porque precisa disto para viver, porque ainda não superou o assassinato de seus pais e porque uma cidade inteira depende dele. Na minha humildíssima opinião, estes fatos apenas comprovam o mais completo personagem de histórias em quadrinhos.

Ufa!! Desde criança esperava fazer esta declaração!! Agora sou um homem feliz e podemos voltar ao tema do post!!

Blackfire é a representação fiel do fanatismo religioso, tema que talvez seja mais atual do que em 1988, época do lançamento da revista. A lavagem cerebral que o vilão realiza em seus seguidores ocorre em abundância no mundo real. Inúmeras pessoas seguem falsas doutrinas, que muitas vezes possuem interesses escusos e ilegais. A mensagem é clara: o poder destes "líderes espirituais" pode ser mais incisivo do que crimes e planos mirabolantes (pois é Coringa, você se deu mal desta vez...).

O Messias é perturbador - como já disse acima - também pela violência. Seu filho de seis anos gosta de Batman? Pois bem, deixe-o longe desta HQ. Mortes barbáras, decapitações e esquartejamentos acontecem aos montes ao longo das quase 200 páginas da obra. Parece que o mundo surtou de vez, as leis servem como meros fantoches e não existem mais formas de conter o mal (qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência...)

Somado a tudo o que foi descrito, temos uma belíssima arte de Wrightson e revolucionárias formas de composição das páginas. Eu, ao menos, nunca tinha visto um quadrinho se quebrar como um espelho... Genial!!! Isso sem falar em um dos modelos mais destruidores do Batmovel...



Batman - O Messias é uma grande obra-prima do Cavaleiro das Trevas. Tão pesado e instigante que entra fácil na lista das melhores histórias já escritas para um herói. Para quem se interessou, é fácil encontrá-la em lojas como Americanas, Saraivas e Submarinos da vida.

terça-feira, 14 de julho de 2009

O Amanhã Nunca Se Sabe - O Retorno

Após um looooooooooooooooooooooooongo tempo inativo, este humilde blog volta ao trabalho normal, com novo layout, cacarecos e blá blá blá...

E, além do retorno, vou propor algo novo. Agora, ao invés só de resenhas de filmes e livros, textos sérios e comentários céticos, também escreverei sobre tudo o que der na telha: cinema underground, games, HQ's, política, esporte.

E ainda tem mais!!! Colocarei humor e acidez satírica onde couber, da melhor forma possível.
Afinal, como diria José Simão: "Nóis sofre, mas nóis goza"!!

E senta que lá vem história...